sábado, 5 de abril de 2008

Madrigal Melancólica

O que eu adoro em ti

Não é sua beleza

A beleza é em nós que existe

A beleza é um conceito

E a beleza é triste

Não é triste em si

Mas pelo que há nela

De fragilidade e incerteza

O que eu adoro em ti

Não é a tua inteligência

Mas é o espírito sutil

Tão ágil e tão luminoso

Ave solta no céu matinal da montanha

Nem é tua ciência

Do coração dos homens e das coisas

O que eu adoro em ti

Não é a tua graça musical

Sucessiva e renovada a cada momento

Graça aérea como teu próprio momento

Graça que perturba e que satisfaz

O que eu adoro em ti

Não é a mãe que já perdi

E nem meu pai

O que eu adoro em tua natureza

Não é o profundo instinto matinal

Em teu flanco aberto como uma ferida

Nem a tua pureza. Nem a tua impureza

O que adoro em ti lastima-me e consola-me

O que eu adoro em ti é a vida!


Manuel Bandeira (1886 - 1968)

Nenhum comentário: